O caminho do pigmento melanina de uma célula da pele para outra

Duarte Barral e Liliana Lopes

 

O que vos levou a preparar este artigo de revisão?

No nosso laboratório Tráfego Membranar na Doença investigamos os mecanismos de transferência da melanina na pele. Sendo um dos poucos grupos no mundo que investiga este assunto, estamos numa boa posição para rever o estado da arte do conhecimento nesta área. O pigmento melanina, que dá cor à nossa pele e protege as células da pele dos efeitos genotóxicos da radiação ultravioleta (UV), é produzido por células chamadas melanócitos. No entanto, o pigmento não permanece dentro dessas células e é transferido para outras células adjacentes da pele - os queratinócitos. Este é um processo único no nosso corpo, no qual o compartimento celular onde a melanina é armazenada, chamado melanossoma, não permanece na célula onde é produzido (o melanócito) e é transferido para um tipo de célula diferente (o queratinócito). Portanto, este é um sistema cooperativo entre dois tipos de células que é essencial para garantir a proteção conferida pela pigmentação da pele. Notavelmente, esses processos foram observados pela primeira vez na década de 1960 e ainda são pouco compreendidos e caracterizados. No entanto, existem pistas de diferentes estudos que podem ser seguidas para esclarecer os mecanismos envolvidos, e nosso objetivo é rever e sistematizar esses estudos para impulsionar o avanço nesta área.

Porque é isto é importante?

A pigmentação da pele atua como um protetor solar natural e protege as células da pele contra o cancro. Portanto, é importante compreender como o sistema funciona. Além disso, as vias moleculares e reguladores envolvidos podem servir como alvos para regular a pigmentação da pele, seja aumentando-a ou diminuindo-a, o que pode ser aplicado no tratamento de distúrbios de hiperpigmentação ou hipopigmentação, bem como na indústria cosmética.

Podem usar uma analogia para ajudar a compreender esta área?

Podemos pensar numa célula como uma cidade e um órgão/sistema como um país, com diferentes cidades que produzem bens diferentes e fornecem serviços diferentes. Algumas cidades são mais industrializadas ou têm indústrias específicas, produzindo bens usados por outras cidades. Isso é o que acontece na nossa pele, onde os melanócitos atuam como a fábrica que produz a melanina e a armazena em compartimentos chamados melanossomas, que são organelos em formato de bola de rugby. Posteriormente, esse pigmento é transferido para células vizinhas chamadas queratinócitos, que estão diretamente expostas à radiação UV da luz solar. Esses queratinócitos organizam a melanina no topo de seus núcleos (entre o núcleo e a superfície da pele), de forma similar a um chapéu feito de melanina que protege o material genético (ADN) dos danos causados pela radiação UV.

Que questões permanecem por fazer e gostavam de responder?

Muitas perguntas continuam sem resposta, entre as quais, as seguintes:

  1. Como se processa a comunicação entre os melanócitos e os queratinócitos? Foi postulada a existência de uma sinapse pigmentar, mas ainda não foi caracterizada;
  2. Quais são as diferenças no processamento da melanina nos queratinócitos que determinam as diferentes cores (tons) da pele entre fototipos distintos? Por outras palavras, qual é a base celular e molecular das diferentes cores da pele?;
  3. Qual é o mecanismo envolvido na formação de coberturas supranucleares acima dos núcleos dos queratinócitos, e como essa organização é fundamental para o papel fotoprotetor que a melanina desempenha na pele?

Membros do Laboratório

 

O artigo de revisão publicado na revista científica International Journal of Molecular Sciences  pode ser encontrado aqui.